Introito
O sábado passado começou com dona Lu(ciana) atiçando para inaugurarmos sua adega e espaço VIP, comigo dizendo Sim, sim... enquanto torcia para melhorar de minha condição clínica tocada a alguns medicamentos ingeridos na tarde do dia anterior. Liu, Mário e Edu Viagens (rs) já haviam confirmado presença e eu na sinuca de bico. Melhorei à tarde e, mesmo sem estar 100%, resolvi descontar; algum vinhobão pegaria a conta. A Lu estava de viagem marcada na terça, e senti a ansiedade em suas palavras digitadas (sic) no uátizzapi: 19:30. Risos! Na foto, a Liu em primeiro plano, junto deste Enochato. Atrás, a partir da esquerda, o Mário de joelhos, a Lu em cima da cadeira e o Eduardo em pé 🤣. Vou então recobrar a introdução da última postagem, acerca das supostas mentiras contadas por este escriba. É clara brincadeira quando digo mentir, inventar ou aumentar os relatos aqui no blog. São todos eles absolutamente rigorosos, honestos e verdadeiros, como este, narrando a dancinha alegre de Don Flavitxo. Ou este e este, narrando degustações de vinhos antigos, oxidados. Assim, para proporcionar aos confrades uma experiência diferente e reafirmar honestidade intelectual da publicação - como se fosse preciso -, resolvi escolher um vinho que pudesse estar parcialmente oxidado.O espaço da Luciana já era aconchegante. Ficou mais: uma mesona feita para acomodar tranquilamente 12 pessoas, cadeiras confortáveis e cozinha remodelada. Como diriam, chique no úrtimo. Nesse clima o Eduardo compareceu com vinho da Capadócia, produzido pela vinícola Kocabağ, o Misli Öküzgözü-Boğazkere 2020(?). Misli é o nome do vinho; Öküzgözü é uma cepa nativa da Turquia com características frequentemente comparadas às da Pinot Noir, e muitas vezes cortada justamente com a Boğazkere, outra capa turca, muito tânica - a tradução de seu nome significa queimador de gargantas, e por isso pode ter similaridade com a Tannat. Ao contrário desse terrorismo todo, encontramos um vinho leve, corpo médio e olha lá, com muita fruta no nariz e repetindo-se na boca; taninos discretos, já arredondados, acidez deixando um pouco a desejar, nem tão ligeiro nem tão marcado. Um vinho com certa simplicidade, mas onde narizes melhores provavelmente tirariam melhor proveito - o meu anda um tanto ruim. Seu preço segundo o Edu estaria em uns R$ 85,00.
Depois de viajar para a Argentina, agora a Liu tenta acabar com as maldições trazidas de lá (rs). Brindou-nos com o D.V. Catena Cabernet-Malbec 2021, enquanto a Lu (também participante da viagem coordenada pelo Eduardo) ainda guarda seus medalhões para beber em melhor companhia. O corte é meio a meio, e o vinho passa por 16 meses em madeira numa combinação não linear (sic) de barricas francesas (novas ou não) e americanas. Não entendo esse tratamento para um vinho relativamente simples. Tinha fruta bem evidente e, sendo sincero, ao contrário de um Catena provado anteriormente não estava na goiaba enjoativa; não sei se é questão de safra ou se esse exemplar, mais envelhecido, arredondou com o tempo. Sim, estava melhor equilibrado, apesar da acidez baixa colaborar com a boca ligeira, mas é o que temos para nosso pobre terroir latino americano, sem dinheiro no banco, sem parentes importantes, e vindo do interior... Mas o que tem basta para alguns avaliadores concederem-lhe 93 pontos, embora este Enochato atribua-lhe 83. Convenhamos, é uma nota digna. O Misli, pelo equilíbrio e acidez ligeiramente melhor, levaria seus 85. Aportei às cegas um Amarone Classico 1998 do Allegrini. Esperava fruta mais fresca, mas não encontrei e deixei rolar para ouvir os comentários. O Mário achou estranho, mas sem agredir. Perguntei se ele notava toques de frutas secas, ele disse que sim. De repente a Liu comenta: Couro, bem evidente - um dos sinais de vinho oxidado. Imaginava - somente da minha cabeça - que um Amarone de bom produtor pudesse manter parte da fruta em 20 anos, mas se ela estava lá, não consegui pegar. Tinha uma oxidação equilibrada, sem agredir conforme o Mário repetiu em algum momento, acidez quase média, corpo médio e álcool equilibrado. A persistência não impressionou, e a massa - lasanha prepara pela Lu - não foi um par tão bom, conquanto eles não tenham ido em direções contrárias. Com seus 15% de álcool, se tivesse mantido mais fruta fresca, talvez combinasse melhor. Preciso contar com a indulgência dos confrades para encaixar essa brincadeira na linha de Vino Oxidado, e não em Amarone. E, claro, oferecer-lhes um Amarone mais novo para introduzi-los ao conceito desse vinho. Não tenho outro Allegrini; espero que se satisfaçam com um humilde Tommasi...
Como brincadeira final, balancei o último teco de bebida que restara na garrafa e virei de uma vez em minha taça. Estava lá a borra - já falei sobre ela, aqui. A Luciana providenciou um pão, e todos experimentaram. Houve quem gostou, quem não se pronunciou e quem disse não agrediu (risos!). Eu não havia avisado, e o pão disponível tinha casca macia. Penso se ficaria melhor em um pão italiano, daqueles com casca grossa. De qualquer maneira - espero terem sido todos sinceros - a experiência foi considerada interessante, e dessa maneira este Enochato saiu convencido de ter prestado mais um relevante e inestimável serviço para a humanidade, iluminando com seus magníficos conhecimentos ao menos uma parte dela. Nunca é demais repetir: a borra constitui-se em pequena parte de alguns vinhos, e desprezá-la sem dar-lhe ao menos uma chance pode ser um desperdício. Tente, se tiver oportunidade. Afinal, o bom bebedor deve estar aberto a provar não apenas os mais diferentes vinhos como também aproveitar as dicas que vão surgindo no meio de seu caminho. Com relação à ultima postagem, agradeço ao Roger a paciência em discutir uma concordância capciosa proposta pela minha genialidade sem limites, turbinada a umas boas talagadas de uísque, quase à meia-noite, minutos antes de sua publicação.
A Liu insistiu ter pago cerca de R$ 80,00 pelo D.V. Catena, na Bodega. Não duvido. Mas encontrei oferta dele mais em conta na Argentina: R$ 52,00. Pergunta: se a loja na Argentina vende a R$ 52,00, por quanto sai da Bodega? Sei que aqui ele custa... R$ 230,00.
Tungas (pobre consumidor)
Como o leitor deve suspeitar, assino diversos negociantes de vinhos brasio afora. Estes dias recebi uma oferta aparentemente inebriante:
Veja o sublinhado: 30 dólas lá fora. Isso dá, nada nada, convertendo pelo oficial, sem IOF, R$ 156,00. Olhando o sítio do produtor, confirmamos o valor:
Mas olhando no comércio em geral (de 'lá', claro...)
A tragédia, por óbvio, não para por aí. O Honorável Consumidor é atraído para uma semana de ofertas dedicadas à sua nobre pessoa, com descontos de (ate!) 35%.
Claro, é anunciado em de maneira geral como 'Descontos de 35%' ...
mas quando vamos olhar parte deles está em 20%...
Só que a naba (sic! rs!) repete-se:
convertendo, R$ 101,00! Ou seja, de 5,75x sem desconto fica na 'promo' apenas 3,75x! Feliz cliente desavisado, comprou sem consultar o Wine Searcher? Os acionistas da importadora levantam-se em salva de palmas pelo seu desapego ao dinheiro... Até qualquer hora...